
Quando algum dia pensaríamos que carregar uma bíblia debaixo dos braços poderia sugerir um comportamento reprovável na sociedade por sinalizar insensibilidade e desumanidade de alguém intolerante, que se alimenta do ódio ao diferente?
Quem assim pensa e discursa não leu atenta e sinceramente a bíblia sagrada cristã ou não quer saber dela. No entanto, não perde tempo em difamar seu nobre conteúdo, bem como em desconsiderar as incontáveis e atemporais evidências de transformação e de restauração individual que o modo de vida cristão, saudável e equilibrado, permite àqueles que honestamente e voluntariamente escolhem seguir a Jesus e seus conselhos.
É claro, se é verdade que autonomia e voluntariedade são requisitos pessoais individualizados indispensáveis às genuínas conversões religiosas (que transformam o ser humano para melhor), também o é o fato de não haver uma única alma que tenha realmente se voltado para Deus sem provar e sem conviver com abnegações e dores subjetivas profundas, estas inevitavelmente derivadas de um duro e difícil caminho de luta e de abandono progressivo de uma natureza intrínseca de incompletude, imperfeição e intencionalidades questionáveis do ponto de vista do bem em si mesmo considerado.
A lógica do “crime” de portar um livro como este, cheio de mensagens de amor, compaixão, perdão, acolhimento e inclusão é a mesma que vê no porte de drogas algo inocente, que interpreta nos atos de criminalidade ou de terrorismo a consumação providente e necessária para a realização de uma estranha e incoerente justiça social, que vibra e comemora a morte de pessoas que pensam, vivem e anunciam publicamente valores cristãos tradicionais.
Estamos a falar da dialética falsamente racional e humanizante que se instaurou com o advento da modernidade por meio de alguns “pensadores”. O modo moderno de inteligir o mundo e a vida com alicerces no relativismo, no ceticismo, na subjetividade e na negação da realidade ou da verdade objetiva legou-nos uma alma inconsciente de si mesma, desordenada para a verdade, para o bem e desejosa de criar artificialmente beleza no caos.
O pano de fundo dessa incoerente inversão paradigmática de princípios, que nos faz trocar valores adquiridos naturalmente por valores construídos artificialmente, bem como nos influencia a dirigir nossas compreensões e interesses ao encontro do mal, tendo-o como bem, e por outro lado, nos conduz a rejeitar, julgar e a incriminar o bem, considerando-o como um mal, está estendido sobre um patológico mecanismo espiritual e psíquico de defesa da moral individual diante do erro. Esse mecanismo, embora inútil ou ineficaz (porque não muda a realidade da natureza de nossos atos e intenções para o mal), afeta o ser humano que não se rende diante da verdade comum a todos.
No ato de existir, constantemente somos confrontados com o absoluto que impõe sua voz a nós, ora aprovando-nos, ora reprovando-nos. Nesses instantes, temos duas opções. Podemos escolher abrir os ouvidos para acatar a aprendizagem da realidade que se dispõe a nos ajudar para conhecermos mais sobre nossa própria alma e sobre mundo à nossa volta; momentos em que nos aproximamos mais de Deus, de nosso eu profundo, do sentido de vida particular ou específico a cada pessoa e da felicidade na vida diária. De outro modo, podemos tapar os ouvidos com nossas anacústicas e vazadas mãos para permanecermos deuses de nós mesmos e, portanto, débeis, ignorantes em relação a quem somos e qual é o real bem a ser buscado em nossa trajetória diária. Rejeitamos, assim, o som da vida, hábil a fazer vibrar em nós e nos iluminar para a obtenção do conhecimento, o que inevitavelmente seria capaz de nos trazer a paz interior de um intelecto que encontrou a verdade e nos orientaria também ao bem que satisfaz de modo profundo e constante toda vontade humana.
É uma questão de escolha!
A primeira possibilidade nos deixa mais humildes e nos capacita, mesmo com imensas falhas e dilemas, a vermos o bem como bem e nos eleva a sermos misericordiosos e dispostos ao perdão ou à anistia de quem muitas vezes nem precisa imaterialmente dela.
A segunda possibilidade, contudo, nos mantém altivos, ressentidos com verdade, causando-nos uma distorção cognitiva e psíquica que nos faz desejarmos o mal como bem e a perseguir cruelmente o bem como mal.
Isso já aconteceu outras vezes na história. Basta lembrarmos que o próprio Apóstolo São Paulo, à época Saulo de Tarso, perseguia os primeiros cristãos em sua falsa intelectualidade baseada em uma espécie de religião de homens para homens.
A perseguição aos cristãos e aos seus hábitos de vida sempre esteve atrelada a civilizações que adotaram um tipo de fé e de espiritualidade materialista, imanente, que nega haver transcendência a uma existência limitada ao tempo histórico. É o nosso caso, nossa sociedade tem adotado uma espécie de religião cívica ou institucional, cuja divindade ora se identifica com a subjetividade individual, ora com o Estado, ora com a personalidade de tiranos, disfarçados em meio a discursos ocos, secos, infrutíferos, como se fossem pais dos pobres e oprimidos, ora com a ordem jurisdicional positiva e assim por diante.
Particularmente, prefiro viver à margem dessa “burocracia” que sufoca e aliena a alma, o espírito humano, pois quero sempre poder sorrir ao ver alguém com sua bíblia em mãos, seja anunciando suas doces e providentes palavras ou tão somente carregando-a carinhosamente debaixo dos braços e, quem sabe, vestindo-se elegantemente com cores brilhantes e vivas, como o azul do céu, que se estabelece acima dos homens e seus “poderes”, e o verde-amarelo, tons imensamente abundantes em nossa rica e produtiva terra amada.
Abs.
T. Assinger